Os portugueses conhecem a diabetes, sabem que, por cá, lidamos com o flagelo das doenças cardiovasculares, “mas desconhecem a forte associação entre as duas”. Quem o diz é João Filipe Raposo, diretor clínico da Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal (APDP), que deixa o alerta, salientando que “o facto das complicações cardiovasculares e outras complicações parecerem surgir tardiamente na evolução da diabetes, dificulta a compreensão desta associação e também a motivação das pessoas com diabetes em alterar estilos de vida ou a aderir mais aos tratamentos propostos”.-
Retinopatia, neuropatia, doença aterosclerótica cardíaca ou cerebral, pé diabético, depressão, são várias e diferentes as complicações associadas à diabetes. A esta lista juntam-se ainda a insuficiência cardíaca e a doença renal crónica, complicações que surgem precocemente na pessoa com diabetes tipo 2, sendo desconhecidas para esta. Por isso, esclarece o especialista, “as pessoas com diabetes devem ter um acompanhamento por parte de equipas de saúde multidisciplinares de proximidade, devidamente treinadas nas competências específicas do que é o tratamento destas pessoas”.
Mais ainda, o especialista defende que “o diagnóstico precoce das complicações da diabetes deve ser uma exigência por parte das pessoas com diabetes e dos sistemas de saúde. Só o tratamento inicial da diabetes e das eventuais complicações levará a um menor peso do que estas representam em custos para o nosso país”.
Para aumentar a consciencialização, João Filipe Raposo considera necessário “saber dar a informação de forma adequada e criativa a toda a população. Precisamos de saber medir o impacto das campanhas que implementamos, nomeadamente através da medida dos resultados em saúde a curto, médio e longo prazo. Precisamos também de mais formação e de recursos adequados nas estruturas de saúde para poderem dar respostas efetivas às necessidades da nossa população”.
Numa altura em que, de acordo com os dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) 67,6% da população portuguesa acima dos 15 anos tem excesso de peso ou é obesa1, e sabendo que a maioria das pessoas com diabetes tem excesso de peso ou obesidade2, aqui o combate “tem de ter como ponto de partida a adoção de uma estratégia global de intervenção ao longo do ciclo de vida das pessoas, começando ainda na fase pré-natal (motivando as futuras mães e pais para a necessidade de manter um ambiente saudável para os seus filhos), passando pelo ciclo escolar, entrada no mercado de trabalho, reforma e envelhecimento ativo. Esta estratégia tem de ir mais além do que o da participação das estruturas e recursos tradicionais da saúde, englobando todos os parceiros da comunidade, redefinindo políticas de urbanismo, trabalho, mobilidade, alimentação, etc”, reforça o especialista.
João Filipe Raposo refere ainda que “a prevenção da diabetes mellitus tipo 2 passa pela mudança de hábitos alimentares (de escolhas menos saudáveis para escolhas mais saudáveis e em menor quantidade do que habitualmente) e pelo aumento da atividade física, promovendo a redução do peso corporal”. Mudanças que, ainda que aparentemente de responsabilidade individual, “só poderão ter sucesso se incorporadas numa mudança global de sociedade – de uma sociedade facilitadora da diabetes e da obesidade para uma sociedade que conduza à adoção de comportamentos mais saudáveis. É esta a razão do lema da Organização Mundial de Saúde em todas as políticas”.