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Obesidade e Apneia do Sono

Artigo de opinião por Mafalda van Zeller e Vânia Caldeira – Pneumologistas. Sociedade Portuguesa de Pneumologia – Comissão de Trabalho de Patologia Respiratória do Sono

No Dia Mundial da Obesidade é essencial relembrar a associação desta epidemia
dos nossos dias aos problemas de sono. Sabemos que a privação crónica de sono é
um problema das exigências da sociedade actual, mas também que a evidência
científica tem demonstrado uma clara relação entre a privação de sono e a obesidade.
Quando dormimos pouco habitualmente temos mais apetite e fazemos piores escolhas
alimentares (alimentos mais calóricos). Isto relaciona-se com o facto de a privação de
sono aumentar a produção de grelina (hormona que estimula o apetite) e diminuir a
leptina (hormona da saciedade). Assim, sono insuficiente e inadequado pode
condicionar aumento de peso promovendo um ciclo vicioso.
Além disso, a obesidade é o principal factor de risco para um dos distúrbios do
sono mais prevalentes – a Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS). Nas
pessoas obesas existe a deposição de tecido adiposo na região abdominal e cervical,
comprometendo a permeabilidade da via aérea superior. Durante a noite com o
relaxamento dos músculos desta zona, as pessoas obesas têm maior risco de colapso
da via aérea, originando o ressonar e as paragens respiratórias que caracterizam a
apneia do sono. Esta doença afecta 9 a 24% da população adulta. Cerca de 60 a 90%
dos adultos com apneia do sono têm excesso de peso. Mesmo um aumento de 10%
do peso, aumenta 6 vezes o risco de apneia do sono. A apneia do sono também
ocorre em idade pediátrica (2%) e, sobretudo, na adolescência está associada ao
excesso de peso e à obesidade crescente nestas faixas etárias.
Como problema adicional, frequentemente os obesos têm outras comorbilidades,
como a hipertensão arterial, diabetes, arritmia ou história de enfarte do miocárdio. A
ocorrência simultânea de apneia do sono causa inadequada oxigenação do sangue e
vai aumentar, ainda mais, o risco a nível cardiovascular, cerebrovascular e metabólico.
Os principais sintomas que alertam para o risco de apneia do sono são: ressonar,
paragens respiratórias testemunhadas, despertares nocturnos, necessidade de urinar
várias vezes ao longo da noite, sensação de acordar cansado e com sono não
reparador e sonolência diurna excessiva, com risco de adormecer em situações mais
monótonas. Esta sonolência diurna pode ainda reduzir a atividade física dos doentes,
o que é particularmente relevante nos obesos, doentes que habitualmente já sentem
maiores níveis de desconforto e dispneia para o esforço físico, limitando a sua
atividade e contribuindo para o sedentarismo e aumento do peso, mas também para o
isolamento social e diminuição da qualidade de vida. Além dos riscos para a saúde
física já descritos, a apneia do sono aumenta a irritabilidade e o humor depressivo,
com consequências importantes no bem-estar e saúde mental.
Por fim, a obesidade com a acumulação de tecido adiposo no tórax causa um
aumento do esforço de respirar, como que “aprisionando” os pulmões. Quando isto
acontece pode ocorrer a Síndrome de Hipoventilação da Obesidade, que causa
alterações nos níveis de oxigenação no sangue dos doentes e leva à acumulação de
um gás tóxico (o dióxido de carbono). Cerca de metade das pessoas com índice de
massa corporal superior a 50 têm esta doença. Entre os sintomas mais frequentes
estão o cansaço diurno, a sonolência e a dor de cabeça ao acordar. Cerca de 90%

destes doentes têm também apneia do sono. Quando não tratada pode ser uma causa
de insuficiência cardíaca e aumentar significativamente o risco de morte.
O tratamento da SAOS, tal como muitas outras doenças, começa por alterações do
estilo de vida e, na maioria das pessoas com SAOS, isso inclui a aproximação ao peso
ideal. A perda de peso está associada a menor propensão ao colapso da via
respiratória superior, seja pela redução de perímetro cervical (redução gordura na
região do pescoço), seja pelo aumento dos volumes pulmonares (redução gordura
abdominal).
A perda de peso reduz muitos dos sintomas relacionados com SAOS como a
sonolência diurna e a irritabilidade, com uma melhoria global na saúde cardiovascular
e metabólica e melhoria da qualidade de vida. A perda de peso permite não apenas
um melhor controlo das doenças cardiovasculares e metabólicas associadas, como
uma perda de 10-15% de peso diminui em 50% a gravidade da apneia do sono.
Estudos mostraram que com a normalização do peso até 60% dos doentes com SAOS
podem deixar de precisar de tratamento dirigido. Assim, os benefícios da perda
ponderal parecem ser independentes da técnica usada, mas proporcionais ao peso
perdido.
Paralelamente à perda de peso, muitos doentes obesos com SAOS podem ter
indicação para tratamento com dispositivos de pressão positiva na via aérea (CPAP),
ventiladores para usar enquanto dormem. Além da melhoria significativa da
sonolência nestes doentes, o tratamento da SAOS poderá facilitar ainda a perda de
peso ao melhorar a qualidade de sono e as alterações hormonais (diminuindo a
grelina e aumentando a leptina). Adicionalmente, o benefício do tratamento com CPAP
está bem estabelecido no que respeita a redução do risco de arritmias, redução e
melhoria no controlo da tensão arterial e redução global do risco cardio e
cerebrovascular (nomeadamente de AVCs).
No Dia Mundial da Obesidade relembramos a importância do controlo do peso
também para evitar doenças respiratórias do sono que aumentam o risco para a saúde
e a mortalidade, além de terem impacto no bem-estar físico e mental.

By | 2022-02-17T23:56:43+01:00 Fevereiro 25th, 2022|Categories: Sin categoría|Comentários fechados em Obesidade e Apneia do Sono

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