Eu devo um enorme pedido de desculpas aos meus leitores pela rotunda falha de prognóstico eleitoral no mês passado quando escrevi aqui: Um Governo de Maioria Presidencial, um cenário que me parecia plausível em face de um previsível empate técnico indicado pelas sondagens entre os dois maiores partidos portugueses.
Tecer aqui mais comentários sobre estes resultados eleitorais seria como bater num cavalo morto, tal a exaustão de análises e debates que os canais televisivos em Portugal, mas também no Brasil e em Espanha, já nos transmitiram.
A minha única observação foi constatar que apesar de um brilhante desempenho pelo seu ex-líder, o CDS não conseguiu (até agora) entrar neste novo arco parlamentar. Isto apesar de eu discordar em absoluto quando o Chicão defendia que o debate sobre a regionalização deveria ficar na gaveta.
Este resultado mostra como existe uma clara separação entre as decisões que tomamos e os resultados que finalmente alcançamos.
Este artigo Decisions vs. Outcomes elucida bem o que escrevo mais acima:
A decision and it’s outcome are separate and distinct. Your goal should be to make the best decision possible under the circumstances, then release from the outcome. Don’t blame yourself if the outcome isn’t what you wanted or expected. You don’t have control over everything, only what you can do personally.
wisedecisions.com
É também por esta razão que devemos baixar enormemente as nossas expectativas em relação a um governo suportado por uma maioria absoluta do PS e com reais possibilidades de fazer história ao colocar Portugal numa senda de crescimento e bem estar social sem precedentes.
Porque é a História que nos ensina que em regimes ainda mais totalitários que o de uma democracia com maioria absoluta, Portugal nem sempre teve os melhores resultados. Tudo depende de muitos outros factores para além da qualidade das decisões que tomar um líder, veja-se o caso de Sebastião José de Carvalho e Melo como grande exemplo da nossa história e cada país terá os seus.
No final, ao fim de 800 anos como um país independente (e dos mais antigos do mundo), que deu novos mundos ao mundo, que se libertou de um regime totalitário repressivo utilizando flores em vez de balas, que conseguiu a independência de Timor sem deslocar nenhum porta-aviões, que tem o Secretário-Geral na ONU, que tem o melhor futebolista do mundo, e que mostrou ser um exemplo mundial na vacinação COVID-19, poderíamos estar pior.
Para além de um bom ou mau governo, quem realmente determina o que pode ou não ser Portugal, são os portugueses, é a sociedade civil portuguesa e quando esta se mobiliza tudo consegue.
Como melhor repartir escassos recursos?
É hoje evidente que no reparto e aplicação equitativa dos recursos que o Estado português dispõe – e que serão sempre escassos face às necessidades – podemos pensar em vários modelos.
Usando aqui um primeiro exemplo, quando num país pobre chega um camião para repartir ajuda humanitária, as pessoas amontoam-se ao seu redor e o repartidor de alimentos irá sentir-se tal como um ministro das finanças que gere um orçamento limitado e centenas de pessoas a gritar, para mim, para mim, aqui, eu primeiro que tenho mais necessidade! Conseguem imaginar o cenário?
Um outro cenário poderia ser o de reunir primeiro com os líderes de cada aldeia e fazer uma repartição justa e equitativa por cada uma, respeitando o número de habitantes, sendo depois a aldeia que fará a distribuição dos recursos recebidos de modo mais eficaz, por serem mais conhecedores das suas próprias necessidades.
Este é, na essência, o motivo pelo qual a regionalização pode ser a forma mais justa de repartir equitativamente recursos escassos e garantir que estes sejam bem empregues.
Um cenário de futuro para Portugal
Quero recomendar aqui um brilhante trabalho feito pela Fundação Calouste Gulbenkian sobre o Portugal que poderemos ser em 2030 – Foresight Portugal 2030 – cuja síntese será enviada a todos os participantes para informar os debates na próxima edição da Cimeira das Regiões de Saúde próximos dias 28 a 30 de março, no Funchal.
Pensar que a regionalização seja um processo que irá partir Portugal aos pedaços e que deve ficar na gaveta é uma opção.
Mas podemos ver igualmente na descentralização de algumas funções do governo central para as regiões como a grande oportunidade para dar ao País aquilo que lhe têm faltado, um pujante crescimento económico assente num modelo de estado social moderno e equitativo.
Tornando as regiões mais inteligentes
Escrito tudo isto até aqui, a continuidade de António Costa como Primeiro-Ministro de Portugal abre finalmente o caminho para voltarmos a falar de regionalização. Mas será, sem dúvida, uma regionalização inteligente que seja capaz de combinar as bondades da experiência autonómica portuguesa (um caso de sucesso e orgulho nacional) com os benefícios de uma gestão central, apenas quando esta seja mais eficaz.
Neste cenário, para que possam existir “smart regions” em Portugal, deve existir primeiro um “smart government”, aquele que sabe delegar nas regiões parte das suas competências para que não ocorram os silos entre diferentes ministérios e conseguir uma resposta em Saúde mais articulada com a Segurança Social ou com a Educação ou mesmo com o Ambiente, em cada município, como em cada bairro ou aldeia de Portugal.
As Regiões Autónomas portuguesas têm hoje esta capacidade de agregar a ação de governo localmente e podemos e devemos partilhar, entre todos, as experiências no domínio da Saúde para melhorar a nossa resiliência numa nova era post-pandemia que continuará a ser muito imprevisível.
Siga aqui neste canal YouTube as reuniões e os debates do próximo Health Regions Summit dias 28 a 30 de Março evento híbrido emitido a partir da cidade do Funchal.
Fonte imagem de topo: El País