Se eu afirmar que este será um ano histórico no SNS português ninguém duvidará.
Desde logo, se do Presidente da República depender, 2023 será o ano do tudo ou nada para a atual legislatura, mas dar um pouco de pressão ao governo do Estado do qual é o chefe também faz parte de um normal exercício do poder que lhe é conferido por todos os portugueses.
Mas aqui não se trata disso, após quase meio século de história o SNS constitui-se numa grande ‘região autónoma de saúde’ no continente português e passa a ter uma gestão executiva em quase tudo idêntica à que hoje já têm as regiões de saúde dos Açores e da Madeira e que já demonstrou ser bem mais eficiente.
Está claro que temos aqui um enorme efeito de escala, a região de saúde continente é 20 vezes maior em população e um dos desafios da atual direção executiva será, precisamente, decidir o que fazer das atuais Administrações Regionais das 5 ‘sub-regiões’ do continente, como poderão ajudar a colmatar o déficit de gestão do SNS que o debilita e faz derrapar estrepitosamente.
Ana Sofia Santos escreveu no Expresso desta semana, 2.470 milhões de euros era o valor da dívida dos hospitais públicos aos fornecedores externos (em causa estão, em particular, medicamentos e dispositivos médicos) em novembro, segundo o Portal da Transparência do SNS. A dívida vencida estava nos €1567 milhões e os pagamentos em atraso (quando passaram mais de 90 dias desde o fim do prazo) somavam €874 milhões.
O melhor presente de Natal que os fornecedores do SNS poderiam ter este ano, foi o anúncio de uma injeção de €1022 milhões para saldar dívidas e compor as contas das unidades de saúde do SNS aprovada pelo conselho de ministros no dia 24 de dezembro.
Mas será que o mais generoso orçamento de sempre na saúde poderá voltar a derrapar?
A questão certa não é se irá faltar dinheiro no SNS, mas quando.
Se continuarmos a usar as mesmas receitas para tentar obter resultados diferentes, é seguro o fracasso de tentar manter as contas certas.
Os gastos em saúde seguem a mesma lei de Moore aplicada aos microchips e processadores, crescem exponencialmente.
Teremos que encontrar um novo paradigma para a cocriação de saúde pela própria sociedade (poder local, associações e setor social, comunidades etc.) tal como tem vindo a ser defendido pela Fundação Calouste Gulbenkian há 9 anos atrás, quando trouxe a Portugal o primeiro CEO do NHS, Lord Nigel Crisp na iniciativa Um Futuro para a Saúde e, recentemente, de novo entre nós na III Cimeira das Regiões de Saúde.
No livro Health is Made at Home, Hospitals are for Repairs, Nigel Crisp apresenta inúmeros exemplos de como a cidadania e as suas comunidades podem elas próprias ser geradoras de respostas criadoras de saúde e que são altamente sustentáveis. Se o SNS se converter não apenas numa agência estatal para otimizar a gestão de hospitais públicos mas também numa espécie de Banco de Fomento da saúde dos portugueses e colocar os recursos certos nas pessoas certas, iremos ter uma população muito mais saudável e é esse, e não outro, o elemento crítico para tornar sustentável qualquer serviço nacional de saúde.
No último debate na hora (YouTube) sobre a especialidade de medicina de urgência (também pode ser revisto aqui no Linkedin), ficou claro que nos países onde as consultas de cuidados de proximidade são mais frequentes, diminuem marcadamente as entradas nas urgências.
Participação e debate
Um Think Tank ou laboratório de ideias é uma reunião privada em que os participantes abordam tópicos diversificados que intersectam a estratégia, a tecnologia e a política, geralmente levados a cabo por organizações sem fins lucrativos, como é o caso do Fórum Hospital do Futuro.
Em 2023, colocamos em marcha o Think Tank SNS de Contas Certas e Saúde Sustentável, com o qual pretendemos estimular o debate e a inovação sobre o papel que o Estado, a sociedade civil e o sector social e privado poderão todos desempenhar para um SNS moderno e inovador, com as contas equilibradas e onde a coprodução de saúde seja uma realidade.
Junte-se a nós: aqui.