Artigo de opinião pelo Dr. Jorge Alcaravela
A fibrilhação auricular (FA) é a arritmia crónica mais frequente e pode afetar cerca de 10% da população com mais de 70 anos. Estima-se que 25% da população com idade superior a 40 anos irá desenvolver FA. Em Portugal, existem cerca de 200 mil a 250 mil indivíduos com esta arritmia.
A FA é um tipo de arritmia cardíaca em que existem batimentos arrítmicos, habitualmente rápidos, entre 80 a 160 por minuto. Nessa situação, a perda de função contrátil das aurículas potencia a formação de coágulos intracardíacos e, eventualmente, a embolização para todo o leito arterial. Consequentemente, o doente com FA apresenta um risco 5 vezes superior de acidente vascular cerebral (AVC), daí a necessidade de terapêutica hipocoagulante na grande maioria desta população.
A FA está associada a doenças como a hipertensão arterial, a diabetes, a insuficiência cardíaca, a doença valvular cardíaca, a doença pulmonar obstrutiva crónica, a apneia obstrutiva do sono, a adição alcoólica, entre outras, apresentando-se na forma permanente ou em crises paroxísticas. Quer na forma permanente ou na forma paroxística, o risco de AVC é semelhante e dependerá das caraterísticas específicas de cada doente. Por outro lado, a FA incrementa o risco de insuficiência cardíaca e morte, diminui a capacidade funcional e acelera o declínio cognitivo.
A grande dificuldade prende-se com o diagnóstico atempado da FA, sendo que a utilização de eletrocardiogramas seriados, do registo Holter 24 horas e do detetor de eventos, são armas fundamentais nesta cruzada.
A necessidade de diagnóstico do primeiro episódio é crucial na prevenção do AVC. A utilização de novos devices como os smartphones e os smartwatches, que conseguem avaliar a frequência cardíaca e a sua ritmicidade, pode ser um auxílio nesta problemática.
A caráter informativo, aquando de uma elevação abrupta da frequência cardíaca, avaliada pelos novos devices, ou numa simples medição da tensão arterial, o doente deve procurar ajuda médica, para testar a veracidade e o tipo de arritmia cardíaca.
A terapêutica da fibrilhação auricular consiste na redução do risco de AVC com a utilização de hipocoagulantes, no controlo da frequência cardíaca e, em alguns doentes, na conversão da FA a ritmo sinusal, que é normal e fisiológico.
A evolução da terapêutica hipocoagulante levou à criação de fármacos mais seguros, com redução do risco de hemorragia intracraniana, e mais cómodos, sem necessidade de monitorização seriada (INR), sendo utilizados na grande maioria dos doentes com FA. Todavia, o risco hemorrágico não deve ser menosprezado e medidas como o controlo da hipertensão arterial e da anemia, a evicção de bebidas alcoólicas e a utilização cuidada de anti-inflamatórios, devem ser aconselhadas.
No controlo da frequência cardíaca e/ou na conversão da FA a ritmo sinusal, a atitude terapêutica baseia-se em fármacos com propriedades antiarrítmicas, na utilização de procedimentos de ablação cardíaca e até de pacemakers, sendo delineada uma estratégia individualizada para cada doente.
Tão crucial como as medidas anteriormente mencionadas, a abordagem agressiva da patologia de base, quer seja cardíaca ou não cardíaca e o controlo apertado dos fatores de risco cardiovasculares são primordiais e estão associados ao benefício evidente na mortalidade e morbilidade.
Em forma de conclusão, a FA é uma arritmia frequente, mais típica do idoso, associada a fenómenos embólicos, nomeadamente o AVC e em alguns casos de difícil diagnóstico. A abordagem multifatorial da FA é a única estratégia a ser considerada e o tratamento passa por uma visão holística do doente.
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