Artigo de opinião de Cláudia Silva, membro da Associação Portuguesa de Enfermeiros de Cuidados em Estomaterapia (APECE)
A ostomia é uma intervenção cirúrgica que permite criar uma abertura artificial no corpo (estoma), com várias finalidades, que vão desde a alimentação e a respiração, à eliminação de fezes, gases ou urina.
Após a criação da ostomia, a pessoa convive com a presença e com o funcionamento do seu estoma, sendo necessário desenvolver competências físicas e emocionais para se adaptar às alterações do corpo, da própria imagem e dos hábitos de vida.
A sexualidade é uma das áreas mais afetadas, tanto pelas alterações orgânicas decorrentes da própria cirurgia e dos tratamentos, como pela dificuldade em lidar com um corpo diferente, com a presença de um estoma e de um dispositivo.
As questões relacionadas com a intimidade e com o prazer sexual são frequentemente relegadas para segundo plano, dado que as inseguranças individuais relativas à capacidade de suscitar desejo sexual são transferidas para os parceiros, resultando frequentemente em períodos de afastamento entre os casais e em abstinência sexual.
A incapacidade de realizar tarefas/atividades habituais pode levar à perda dos diferentes papéis que a pessoa tinha no enquadramento familiar, profissional e social, gerando, sentimentos de desalento, baixa de autoestima, insegurança e disfuncionalidade.
Existem potenciais constrangimentos associados ao funcionamento da ostomia, como fugas e cheiros, ou à presença do dispositivo, criando nas pessoas com ostomia a necessidade de mudar hábitos de higiene, de vestuário e/ou de alimentação.
A sexualidade é uma componente muito importante para a qualidade de vida. Porém, no caso da pessoa com ostomia, passa a existir a presença de um “intruso” entre parceiros.
É necessário que a pessoa tenha uma atitude determinada e proativa, face à doença e à ostomia, e que seja acompanhada por um enfermeiro de Estomaterapia, que a ajude na gestão da imagem corporal, na promoção do autocuidado, da capacitação e da atividade, quer seja motora, social, cultural ou sexual, bem como ao parceiro, diminuindo constrangimentos, dificuldades de comunicação e afastamento entre os casais.
Os enfermeiros de Estomaterapia ajudam a trabalhar a confiança e as emoções, incentivam a pessoa a falar do que mudou e a explorar o corpo, facilitam a adaptação e, com isso, a capacidade de ser e estar consigo e com o outro.
Conselhos práticos:
- Manter os hábitos de intimidade, carinho e cumplicidade existentes antes da cirurgia.
- É essencial continuar a dormir na mesma cama do parceiro. Depois da cirurgia, muitas pessoas não querem dormir na mesma cama, porque têm medo de a sujar ou de incomodar o parceiro. No entanto, existem inúmeros dispositivos no mercado, com diferentes características, indicações e resistências, que permitem dormir tranquilamente sem necessidade de alterar os hábitos. As pessoas com ostomia devem experimentá-los e decidir qual o melhor para si.
- Antes de se deitar, ou de possível intimidade, deve substituir sempre o dispositivo para se sentir mais confortável e confiante.
- Quando se quer expor ao outro, é importante saber disfarçar ou esconder o que o deixa constrangido. Hoje em dia, existe uma oferta variada de ligas, cintas e roupa interior, tanto para mulheres, como para homens, que ajudam a disfarçar a existência do estoma. A confiança é essencial.
- Em situações específicas, é possível controlar o funcionamento do intestino. Quem tem ostomia intestinal do cólon descendente (colostomia), pode fazer uma irrigação intestinal que promove a limpeza do intestino, permitindo-lhe não emitir qualquer tipo de conteúdo (fezes ou gases), durante 24 a 48 horas. Ou utilizar uma cápsula (espécie de tampão), que sela a passagem de conteúdo para o exterior e que permite que a pessoa o possa abrir para esvaziar o intestino e voltar a tapar, sempre que necessário. Nem todas as pessoas com colostomias podem utilizar estas estratégias, pelo que é importante que solicitem orientação a uma enfermeira de Estomaterapia.
Desta forma, é possível fazer as atividades diárias, assim como estar na intimidade, sem que o intestino funcione e sem medo de fugas ou outros constrangimentos.
Além das situações aqui apresentadas, associadas à ostomia, existem também alterações na vivência da sexualidade, decorrentes de disfunções sexuais ou da capacidade penetrativa por parte do homem ou da mulher. É fundamental que a pessoa com ostomia fale abertamente com o enfermeiro de Estomaterapia acerca do que mudou depois da cirurgia e de que forma essas alterações o afetam no seu dia a dia e nas suas relações. Existe terapêutica para o efeito e programas de reabilitação sexual disponíveis, para os quais o enfermeiro de Estomaterapia o pode encaminhar.
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